Preparar o caminho do Senhor

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É preciso com confiança prosseguir na marcha para o Natal, ou seja, “
Preparai o caminho do Senhor” (Lc 3,1-6). À maneira bíblica, como
notam os intérpretes da Sagrada Escritura, São Lucas, situa o
ministério do profeta Jesus, referindo-se aos reis e príncipes
contemporâneos. Estes dados históricos que são confirmados pelas
inscrições e crônicas da antiguidade servem sobretudo para precisar em
que clima político e espiritual vão ressoar a mensagem de João Batista
e, depois, a mensagem de Jesus. Os tempos são outros e a Judéia,
depois de vinte anos, não é mais senão uma província do império
romano. Tibério, o imperador, está longe, mas o prefeito Põncio
Pilatos administra então o país com mão de ferro. Quanto a Caifáz, o
sumo sacerdote judaico, indicado pelos romanos para o cargo no qual
está depois de dez anos, foi com sua diplomacia e sua astúcia que ele
conservou sua posição mais política do que religiosa. Na Galileia,
como em Jerusalém, as manifestações nacionalistas eram severamente
reprimidas e os filhos de Israel pressionados, humilhados pelo
ocupante e isto sem um futuro político e, assim somente em Deus podiam
colocar sua esperança. Uma espécie de sede espiritual crescia em
certos grupos daqueles que criam no Ser Supremo. Escutava-se mesmo
falar, na época de João Batista, de comunidades quase monásticas,
reunindo homens, mulheres e jovens que eram criados, aqui e ali, não
longe do Mar Morto e que guardavam as tradições ascéticas dos
Essênios, movimento judaico antigo do segundo século antes de Cristo.
Foi então que a palavra de Deus se fez ouvir a João, filho de
Zacarias, no deserto, onde o Espírito Santo o havia conduzido. João
deixou seu longo retiro no deserto e se pôs a pregar na região do
Jordão, novamente populoso, e as multidões chegavam até ele para se
fazer batizar. O rito do batismo não era, naquela época, uma novidade
absoluta. Diversos movimentos religiosos o praticavam, por exemplo, na
comunidade de Qumram, às margens do Mar Morto. Banhos cotidianos
reservados aos membros dos essênios que exprimiam seu ideal de pureza
moral no aguardo de uma purificação radical que deveria vir. Em muitos
aspectos o batismo proposto por João se modelava segundo os usos
correntes. Entretanto era oferecido a todos e não somente aos membros
mais meritórios de uma seita e não era recebido somente uma vez, como
último preparativo ao batismo no Espírito Santo que somente o Messias
poderia ofertar. Além disto, o batismo do Jordão era ministrado pelo
jovem profeta João em nome de Deus que o havia enviado. Sobretudo a
seus olhos a conversão era pressuposto indispensável, pois os
discípulos não deviam se contentar em proclamar seu ideal pelas
abluções rituais. Era-lhes necessário se afastar de sua vida pecadora
e se orientar resolutamente para Deus para fazer sua vontade e se
preparar para o perdão dos pecados, desde que o Reino de Deus fizera
irrupção no mundo. A força de convicção de João Batista era tal que
ela evocava irresistivelmente uma outra grande voz profética ouvida
cinco séculos antes e que trazia, da parte de Deus, uma mensagem de
esperança e de conversão:” Desimpedi no deserto o caminho do Senhor. E
aplainai na estepe a estrada para o nosso Deus (Isaias 40,3). Esta
rota de que fala o profeta era rumo a Jerusalém a terra dos
ancestrais. Era um itinerário para os pobres, para que Deus viesse a
eles. Tratava-se de um caminho especial que Deus mesmo iria percorrer
com seus pobres. Deus com eles vai atravessar o deserto, Deus com eles
vai entrar no pais e sua gloria vai se revelar. Passando no deserto
pela estrada de Deus os pobres de Israel encontrariam o caminho de sua
própria liberdade. É exatamente isto que João Batista então anunciava.
Note-se que ele não diz “Convertei-vos para possibilitar a vinda do
Messias que haveria de vir”, mas “Convertei-vos porque Ele vem!” Isto
é certo, é iminente e é necessário se colocar a caminho com Ele. É bem
este o sentido do Advento que estamos vivendo com toda a Igreja. É
preciso se preparar para o Natal para festejar o Filho de Deus que
veio, que vem sem cessar no meio de nós. Acolher Jesus, o Messias de
Deus, recebê-lo como Salvador é resolver partir com Ele; é tomar com
Ele o trajeto salutar, porque Ele vem entre nós para nos conduzir ao
pais da glória, isto é, do amor do Pai que deve ser o objetivo do
mundo e da história dos homens. Jesus, o Filho de Deus, vem entre nós
para compartilhar conosco em nossa caminhada com Ele, atravessando o
deserto de nossa história coletiva ou de nosso percurso pessoal. *

 

Professor no Seminário de Mariana 40 anos.

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