Amar a Deus e amar o próximo

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No tempo de Jesus algumas pessoas mais esclarecidas em sua fé
procuravam estabelecer uma hierarquia entre as múltiplas obrigações da
Lei. Daí de um deles perguntou a Jesus “Qual o primeiro de todos os
mandamentos?” (Mc 12, 28-34) O Mestre divino respondeu inicialmente
citando o Deuteronômio (6,5) um belo texto que todos sabiam de cor,
porque já no tempo de Jesus todos os judeus deviam recitá-lo ao menos
duas vezes por dia: “Escuta Israel, o Senhor, nosso Deus, é o único.
Tu amarás o Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma,
de todo o teu pensamento e de toda tua energia”’. Para nós ocidentais
hodiernos o coração serve sobretudo para amar, para um hebreu o
coração tem também sua parte na atividade intelectual Deus dai-me um
coração para compreender (Dt 29,3). Para os judeus do tempo de Jesus,
o coração era às vezes consciência e memória, intuição e força moral.
No coração ressoam todas as afeiçoes, mas é também no coração que as
impressões e as ideias se transformam em decisões e em projetos. É
sobretudo no coração que se enraízam a postura de quem crê e a
fidelidade sincera a Deus, Assim sendo o coração no sentido bíblico, é
assim o homem inteiro interior e lugar privilegiado da manifestação da
fé. Deste modo, “Tu amarás o Senhor teu Deus de todo o teu coração”
significa que toda a pessoa humana será mobilizada pelo amor de Deus,
tendendo para Deus com o melhor de si mesmo. Jesus, contudo, ajuntou
imediatamente, citando desta vez o Levítico (19,18): “Tu amarás o teu
próximo como a ti mesmo” É o segundo mandamento sempre inseparável do
primeiro e, entretanto, sempre distinto. Isto porque o amor do próximo
não pode tomar o lugar do amor para com Deus, ou seja, o próximo não
deve substituir Deus. Entretanto, os dois mandamentos são semelhantes
porque o amor do próximo, como o amor por Deus devem mobilizar toda a
pessoa e todas suas energias. Não se pode verdadeiramente se aproximar
de Deus sem começar a amar tudo o que Deus ama. Mais se está perto de
Deus, mais se torna próximo dos outros filhos de Deus. Santa Terezinha
do Menino Jesus dizia que a caridade é tudo nesta terra e alguém é
santo na medida em que ela é praticada. O escriba que interrogara
Jesus responde então a Ele que o que Ele disserta era a pura verdade.
Cristo vendo que seu interlocutor havia entendido perfeitamente o
ensinamento lhe diz: “Tu não estás longe do Reino de Deus”. Note-se
que Jesus assevera que este escriba não está longe o que significa que
ele ainda não praticava totalmente o que lhe fora falado, isto é, que
cada um de nós deve se examinar para diagnosticar se vive na prática,
em plenitude, o amor a Deus e ao próximo. Não basta proclamar que é
verdade o que jorrou dos lábios de Cristo, querer dar um sentido à
própria vida, ao seu trabalho, aos seus sofrimentos, enfrentando o
turbilhão dos acontecimentos diários, mas é preciso ainda tudo fazer e
aceitar com muito amor no coração, tudo fazendo para a glória de Deus
e bem do próximo. Nada de se deixar levar pela engrenagem da rotina,
pelas relações superficiais para com o Criador e suas criaturas. A fé
em Deus deve nos conduzir à observância de seus mandamentos. Jesus
leva a seu termo a plenitude da lei. Ele ama o Pai como Deus
verdadeiro, nascido do Deus verdadeiro e, enquanto Verbo feito homem,
Ele criou uma nova humanidade de Filho de Deus, irmãos que se amam sem
restrições. O apelo de Jesus nos atrai para o amor de Deus invisível e
humanamente inacessível e, ao mesmo tempo, é um caminho para nos
permitir reconhecer o amor na vida na relação com os irmãos visíveis e
presentes a nosso lado. Nossa união com Cristo, união de conhecimento
e de amor, insuflado pelo Espírito Santo, deve nos levar ao
cumprimento cabal dos deveres a Deus e a todos os seus filhos. Não
basta conhecer os principais preceitos de Lei do Senhor, mas é preciso
continuar sempre a avançar por transformar estes preceitos em
realidade, pois a adesão plena a Deus se manifesta no caminho da vida
de cada um. O perigo é se deixar levar pelos apelos mudamos que são
sutis. Ídolos escondidos na própria personalidade, na maneira de
viver, Eles devem ser procurados e destruídos São Tiago alertou sobre
o amor pelas coisas do mundo hostil à vontade de Deus, pois quem ama
as coisas do mundo é inimigo de Deus (Tiago 4,4). Portanto, amar a
Deus e ao próximo fielmente, sinceramente, constantemente!

 

*Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.

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