Entrevista: “Isolamento Social e desafios à Saúde Mental”

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1. O Brasil vive a realidade do isolamento social há algumas semanas. Como este período de quarentena pode impactar diretamente na saúde mental das pessoas que tiveram de se adaptar a uma nova rotina de vida: a de ficar sem sair de casa?

Procurando ser objetivo, o tipo de isolamento que estamos vivendo pode provocar um mal muito grande à saúde mental de muitas pessoas, em razão de muitos fatores. Em primeiro lugar, o isolamento por si mesmo é contrário à natureza humana. Temos necessidade do outro, do encontro, da proximidade. Para muitas pessoas, a situação atual de quarentena agrava um quadro de solidão previamente existente e já dolorosa. Nossa sociedade é muito diversificada. Há o jovem que embora sofra com o isolamento, tem à sua disposição um ambiente familiar aconchegante e cheio de recursos, uma certa segurança financeira, e junto a isso muitas formas de ocupar o tempo, como a continuidade dos estudos, o acesso às redes sociais, TV a cabo, programas de stream, etc. Diferente é o isolamento para quem vive sozinho, para as pessoas fragilizadas física e psicologicamente, para as muitas pessoas que vivem em condição de escassez de recursos e em situação de pobreza, etc. Caso esta situação permaneça por tempo prolongado, uma significativa parcela de nossa população será desafiada não somente a se manter saudável diante da ameaça da pandemia e do empobrecimento, mas haverá um significativo agravamento da fragilização do funcionamento mental. Diante disso, penso que a Igreja tem que assumir um papel ativo. Com empenho e criatividade, é possível manter a comunicação com as pessoas, neste momento ainda mais sensíveis e abertas à mensagem de Jesus Cristo e do Evangelho.

2. Como as pessoas que precisam manter a rotina de estudos e trabalho, estando em casa, podem manter-se saudáveis e produtivas neste período de quarentena?

O segredo está em fazer todo esforço possível para dar continuidade à vida, mantendo em casa a rotina e as atividades normais. Os males maiores a serem combatidos são a solidão e a inatividade. É possível, ao menos para muitas pessoas, estar em casa e manter o contato e a relação afetiva com parentes e amigos. Isolamento social não pode se transformar em distanciamento afetivo. Além disso, manter-se produtivo resulta no sentimento de realização pessoal, que é fonte de energia e revigoramento psíquico. É plenamente possível criar em casa uma rotina “quase normal” de trabalho, alternando com o necessário tempo de descanso e convivência, seja com pessoas que residem na própria casa, seja com outras pessoas, por meio dos recursos de comunicação de que dispomos. São prejudiciais tanto o excesso de atividades, e sobretudo atividades repetitivas, quanto a ausência de trabalho. Portanto, com zelo e criatividade é possível manter-se ativo, continuar exercendo atividades de trabalho, de evangelização e de promoção humana, e conservar a saúde física e mental.

3. Como as pessoas podem lidar com os conflitos internos e familiares diante da impossibilidade de sair de casa?

A pergunta é excelente. Creio que este seja um dos maiores desafios. Na rotina de vida que desenvolvemos, muitas atividades são de natureza defensiva, para nos proteger do encontro com os conflitos interiores e interpessoais. Por exemplo, uma pessoa que tenha sérias dificuldades no relacionamento com familiares poderá criar uma rotina em que acabe sobrando pouco tempo para estar em casa, reduzindo o tempo de encontro e o desgaste das relações. O mesmo vale para os conflitos interiores. Inconscientemente, tendemos a fugir destes conflitos, porque provocam grande sofrimento, enquanto o correto seria enfrentá-los. Esta nova rotina de vida, com a obrigatoriedade de estar em casa, rompe com grande parte dos hábitos defensivos que estruturavam a vida, e poderá nos expor aos muitos conflitos presentes até em pessoas psicologicamente saudáveis. Quanto a isso, creio que haverá pessoas que irão crescer em qualidade de vida psíquica com esta nova forma de viver. Mas em muitas situações os conflitos “intra” e interpessoais irão se agravar, e relações já fragilizadas poderão se fragmentar completamente.

4. O excesso de informações pode ser um problema neste período de isolamento social? Como lidar com esse problema?

É outro ponto muito importante. Precisamos ser seletivos na necessária busca por informações. Os mesmos dados e fatos são transmitidos por alguns veículos de comunicação não primeiramente com o objetivo de orientar, mas de forma sensacionalista, para causar impacto, de modo a ter audiência. A mente precisa de alimento saudável. Os programas sensacionalistas e pouco científicos fazem muito mal. Devemos nos proteger e proteger sobretudo as pessoas mais frágeis, como as crianças e pessoas idosas e doentes. Estes conteúdos causam prejuízo ainda maior em alguns horários, como antes de dormir. Podem contribuir para piorar a qualidade do sono e para a produção de pesadelos.

 

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