Uma refeição oferecida por um dos principais fariseus foi propícia para que Jesus focalizasse a importância da humildade (Lc 14,1.7-14). Dois detalhes não lhe tinham escapado. Ele se dirigiu primeiro diretamente aos outros convidados que, sem cerimônia, foram ocupando os primeiros lugares. Corriam o risco de irem para o fim da mesa, caso chegassem outros mais dignos de estarem junto do dono da casa.
Deixou então o Mestre divino sua famosa sentença: “Aquele que por si mesmo se exalta será humilhado, e o que se humilha será exaltado”. Ao anfitrião, porém, que convidara apenas pessoas importantes, visando no fundo ser depois retribuído, o ensinamento foi um desinteresse envolto em humildade. Com efeito, Jesus aconselhou a preferência aos pobres, aos aleijados, aos coxos, aos cegos, esperando, isto sim, a retribuição de Deus no banquete da vida eterna. Apenas os corações humildes estão abertos à gratuidade para com o próximo.
Quando se percorre a Bíblia fica claro que a humildade é o segredo dos amigos de Deus, o segredo do equilíbrio. Por isto bem se diz que a humildade é a verdade. A verdade daquilo que cada um é e isto já abre o caminho para o bom relacionamento consigo mesmo, com os outros e com Deus. Consigo mesmo porque esta virtude leva a reconhecer não apenas as próprias fraquezas, mas também os dons recebidos de seu Senhor. Foi o que se deu com a Virgem Maria que pôde dizer no seu hino de ação de graças que o Criador havia olhado para a pequenez de sua serva, mas também proclamou que o Todo-poderoso nela fizera grandes coisas. Por isto ela mostrou que Deus eleva os humildes e deixa os orgulhosos de mãos vazias. Esta virtude leva também ao bom relacionamento com o próximo, pois o humilde não se julga superior a ninguém. Por outro lado o humilde nunca traz Deus a seu tribunal humano mesquinho e não está a querer que o Onipotente aja conforme seus pobres moldes mentais.
O modelo para cada um é o próprio Cristo que pôde aconselhar: “Aprendei de mim que sou manso e humilde de coração”. São Paulo aos filipenses asseverou que Jesus ‘sendo de condição divina, não se prevaleceu de sua igualdade com Deus, mas aniquilou-se a si mesmo, assumindo a condição de escravo e assemelhando-se aos homens. E, sendo exteriormente reconhecido como homem, humilhou-se ainda mais, tornando-se obediente até a morte, e morte de cruz.’ (Fil 2,7-8). A humildade é simplesmente entáo a imitação do divino Mestre. É deste modo que se podem receber as bênçãos espirituais, sendo imagem do Filho de Deus. Então fica aberto o caminho para a mais absoluta fraternidade, sobretudo para com os deserdados da sorte como bem Jesus ressaltou a seu anfitrião.
O humilde não se julga importante querendo para si os primeiros lugares ou apenas se relacionando com os ricos e poderosos. Ele se reconhece, como disse o papa Francisco, um pecador perdoado, mas amado por Deus e assim tem diante de si horizontes extrarodinários bem diferentes daquele que Jesus percebeu no banquete para o qual fora convidado. Neste ágape reinava ambição e vaidade, resultado da falta de humildade existencial. É esta virtude que faz frutificar a vida do cristão e então esta dá frutos em abundância lá onde a Providência colocou cada um nesstse mundo. Seu lugar na sua família, na sua profissão, na sua comunidade não se julgando melhor ou maior que os outros. Não se trata apenas de uma questão de cortesia humana, uma mera questão de saber viver, mas é uma condição para entrar no banquete do reino eterno.
Para isto é que a humildade e o desprendimento são o fundamento da vida interior, da vida espiritual, do combate contra as forças do mal, Trata-se de agir na lógica de Jesus e não na dialética do mundo, apartada toda vãglória e soberba com relação aos outros. Trata-se de fazer a cada instante que todas as ações estejam de acordo com o projeto de salvação de um Deus sumamente misericordioso. Apenas ele conhece os mais santos, os que mais merecem estar junto de seu divino Filho e, a seus olhos, muitas vezes são os menos aplaudidos pelos homens. Jesus ensina então a não ambicionar os primeiros lugares Isso não significa deixar de lado as responsabilildes de chefe, de educador, sem dureza, mas também sem fraquezas condenáveis. Tudo feito com muito amor envolvendo os mais necessitados em comiseação. Tudo isto modifica as perspectivas meramente egocêntricas.
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho
Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.