O trecho do Evangelho de São Mateus que narra a adoração dos magos
(Mat 2,12) apresenta, além do personagem central que é Jesus, um outro
rei que é Herodes, o cruel, cioso ao extremo de seu poder. Ele ficará
extremamente agitado ao lhe perguntarem sobre “o rei dos Judeus que
acaba de nascer”. Os magos, com efeito tinham vindo para adorar o
soberano universal. Eram pagãos que se apresentaram em Jerusalém à
procura do senhor dos Judeus. Ao lhes dizerem que em Belém da Judeia
que era o local em que isto se daria logo para lá se dirigiram Entram
na casa onde o menino Deus se achava com seus pais Maria e José. Como
bem observou o sábio teólogo Jean-Christian Lévêque, eles foram os
primeiros entre seus irmãos de todos os tempos que vão às Igrejas para
aí encontrar o Salvador universal. A partir deste encontro com Jesus,
os Magos se tornam homens de fé, rompendo definitivamente com Herodes.
Deus lhes indica um caminho de volta guiados não mais por um astro,
mas lhes comunica em sonho para estarem longe dos caminhos herodianos.
Rebrilha a teologia da salvação valorizando este precioso texto. Os
Magos, vindos do Oriente eram sábios, persas ou babilônios,
provavelmente astrônomos que talvez tenham podido ter contato com o
messianismo israelita nas joalherias judias da Babilônia ainda
florescentes na época. Através deles o mundo da ciência se colocou em
marcha para o Redentor, Cristo-Messias. É o universo dos pagãos que se
voltava para a luz do Evangelho. NNão se sabe se eram três, a não ser
o número dos presentes e, é certo, que não eram reis, como aliás não o
afirmaria a tradição cristã antes do Livro aramaico da infância,
datado do VI século. No que diz respeito à estrela, o essencial, que
aliás o texto sublinha, é que aqueles sábios viram nela um sinal e, de
acordo com a tradição dos judeus que considerava o Astro da tribo de
Jacob como um dos símbolos do Messias esperado: ”Eu o vejo, mas não
por agora, eu o contemplo mas não de perto: um astro saiu de Jacob e
um cetro surgiu de Israel( Nm 24,17, oráculo de Balaão) Já os
teólogos da Idade Média, no seu sólido bom senso tinham notado que não
se tratava de um corpo celeste ordinário, dado que seu brilho era
intermitente e seu movimento descontíuo.O certo é que a mensagem
messiânica de todo o episódio é sublinhado pelo texto do profeta
Miquéias que os escribas citam logo a Herodes: “E tu Belém terra de
Judá, tu não és certamente a menor das cidades da judéias, porque de
ti sairá um chefe que apascentará o meu povo de Israel” (Mic 5,1)”.
Ao prosseguir a leitura da profecia de Miquéias chega-se ao presépio e
aos confins do mundo: “Eis por que eles serão abandonados até o tempo
em que dará à luz aquela que deve conceber, e o resto de seus irmãos
voltará para os filhos de Israel (os exilados voltarão ao país). Ele
permanecerá firme e governará com a força do Senhor, eles serão
estáveis, quando ele crescer até os confins da terra e é Ele que será
a paz”. Portanto para São Mateus, a chegada dos Magos a Belém marca
o cumprimento das promessas da antiga aliança. Os Magos ao chegarem
não viram senão um menino, mas o Evangelista, pela sua narrativa tão
clara e tão incisiva, lembra a seus leitores o que a fé deve
contemplar naquela criança, ou seja, o Pastor do povo de Deus, o único
guia para a salvação do gênero humano, o rei da paz e da autêntica
felicidade. São Mateus faz entrever também o destino de Cristo que
seria sempre sinal de contradição, marcado pelo drama da descrença.
Herodes não pensava senão no poder terreno, cogitando apenas em
cidades deste mundo. Os escribas conheciam a fundo as
Escrituras.sabiam de cor as profecias messiânicas, mas não agiram em
consequência ao que elas anunciavam sobre estas verdades atinentes ao
Messias. Segundo São Mateus, os Magos, estrangeiros vindos de longe,
adoraram o Menino e lhe ofereceram seus presentes ouro, incenso e
mirra nele reconhecendo o Senhor dos senhores apesar da pobreza que o
rodeava. Reconheceram a manifestação de Deus ao mundo para a salvação
não só de Israel, mas de todos os povos. Ofereceram-lhe seus dons. A
Jesus devemos oferecer o ouro de nosso mais sincero amor, o incenso do
mais ardente louvor e o sacrifício continuo de cada instante de nossa
vida. Uma entrega sem reserva a quem tanto nos amou e se fez um de
nós. Sigamos, porém, o conselho de São João Crisóstomo, isto é, antes
de nos prostramos ante o Menino Deus, retiremos de nós todas as nossas
misérias para que nossa adoração seja inteiramente agradável a Ele.
Fraquezas e limitações assumidas com humildade, bens e riquezas,
talentos e qualidades, tudo, porém, sendo colocado ao serviço de Deus
e dos irmão e irmãs. *Professor no Seminário de Mariana durante 40
anos.